quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Reflexões sobre Economia da Cultura e Cultura como Desenvolvimento

Essa postagem é resultado de uma série de pensamentos sobre a violência generalizada que o Rio de Janeiro está mergulhado. Ontem Jacarepaguá também foi afetado e uma pergunta foi feita ao twitter, “como se pode pensar em Cultura em meio a tanto caos?”. No mesmo momento uma frase ressurgiu “Cultura é fator de desenvolvimento social e econômico”.

Como assim?

O Rio de Janeiro vive uma crise generalizada fruto de políticas públicas mal formatadas durante anos, principalmente nas áreas de segurança, saúde, educação e cultura. Cada área, além da falta de investimentos, conta com pouco planejamento, profissionais mal capacitados, vícios, constantes modificações a cada novo governo e, sobretudo, não convergência e entendimento das outras áreas.

Quando é dito “Cultura é fator de desenvolvimento social e econômico”, a principal idéia é lembrar que Cultura é muito mais que entretenimento e diversão. E que, logicamente, a Cultura não iria sozinha fazer o papel de segurança, educação e saúde e, nem deve ser pensada com esse intuito. Cada área, formulando políticas no seu âmbito, deveria desenvolver estreita parceria com as outras em questão, bem como também com o turismo, economia, organizações públicas, privadas, entre outras, pensando sempre em ampliar o campo de atuação e ação. Um exemplo, no caso deste texto, a segurança atrelada a cultura, educação e ao turismo são fundamentais para: o respeito aos diferentes grupos sociais; criar condições de continuidade de tradições e difusão; reconhecimento da história dos povos, locais, bens culturais; livre-arbítrio; democratização do acesso; intercâmbio cultural; entre tantas possibilidades.

A idéia de criar este post foi então pensar um tema da cultura que poderia auxiliar o desenvolvimento, como, por exemplo, a Economia da Cultura, muito bem desenvolvido por Ana Carla Fonseca em seu livro “Economia da Cultura – Idéias e vivências”.
O primeiro tópico de início do seu texto é explicar o que não é Economia da Cultura:
Economia da Cultura não é política cultural; economia da cultura não se propõe a definir os rumos da política cultural; economia da cultura tampouco defende que a cultura deva se curvar a economia ou – como às vezes se acredita, maneira muito equivocada – ao mercado. Ao contrário, a economia da cultura oferece todo o aprendizado e o instrumental da lógica e das relações econômicas – da visão de fluxos e trocas; das relações entre criação, produção, distribuição e demanda; das diferenças entre valor e preço; do reconhecimento do capital humano; dos mecanismos mais variados de incentivos, subsídios, fomento, intervenção e regulação, e de muito mais – em favor da política pública não só de cultura, como de desenvolvimento.
Claro que pra iniciar tem que ter o reconhecimento de trabalhar primeiramente uma política pública clara, relacionada, por exemplo, com os problemas que listamos acima e assim poder pensar em Economia da Cultura em si.

Como poderia então a Economia da Cultura auxiliar o desenvolvimento?

Economia: Ciência que estuda produção, distribuição e o consumo de bens e serviços” acompanhando a “Cultura: de forma mais ampla – antropológica – abrange os códigos de valores, modos de conduta e as formas de expressão e de ver o mundo compartilhadas por um povo”. Trabalhando da melhor maneira a Economia da Cultura confere o estímulo a oferta, a condição da criação, distribuição e difusão, além de possibilitar o consumo e a fruição de bens, serviços e manifestações culturais. Em outras palavras este percurso garante a perpetuação de tradições culturais, o estímulo a produção artística, o reconhecimento e a troca cultural, a oferta e liberdade de escolha, percepção de valor (seja ele histórico, científico, sentimental) e preço (quando houver), capacitação de agentes produtivos, crescimento da democracia da difusão, geração de renda. 

Como poderíamos estimular a cadeia da Economia da Cultura?

Política pública:
Construção de política pública clara e consonância entre suas esferas (educação, segurança, saúde, cultura, economia...), pensar e votar com cautela é uma forma de poder cobrar das esferas públicas posteriormente. Lembrar que nosso maior problema sempre foi a política como base eleitoral, trazendo a descontinuidade, troca governo e muda política, não favorecendo a construção. Acompanhar e atuar, muitos fóruns e redes são formados para debater os assuntos e muitas vezes há pouca participação popular. Dedicar a sua área em ações estruturantes, pensando no coletivo, cada um tem que entender seu papel e responsabilidade, não adianta apenas culpar.

Familiaridade Infantil:
Um dos primeiros pontos parte de uma indicação neste mesmo livro de outra pesquisa “O Uso do tempo livre e as práticas Culturais na região metropolitana de São Paulo” de Isaura Botelho e Mauricio Fiore. “Se a criança é inserida no universo cultural, se ele lhe é familiar e integra seu repertório ainda na fase infantil, é muito mais provável que venha a se tornar um adulto participante culturalmente do que o é uma criança alheia ao universo cultural”. Cultura aqui abrangendo não apenas as atividades artísticas, mas o ambiente familiar, a tradição, o viver social.

Produção:
A produção precisa de um terreno favorável para se estabelecer, como criar sem condições como segurança? Principalmente diante desses acontecimentos, muita produção se encontra parada. Ainda haver um incentivo a produção, não apenas no aspecto econômico, mas também no social, o reconhecimento do artista, da cultura, da sociedade. A educação cabe bastante aos dois tópicos, atrelar manifestações culturais, tradições, bens culturais no ambiente educacional possibilita cidadãos mais críticos, compreendendo a história, patrimônio, produção cultural em si.

Tratar da circulação e distribuição:
Artistas, Espaços de Cultura, sociedade, associações, esferas governamentais, privadas precisam garantir a circulação de obras, idéias, compartilhar é muito importante para a liberdade de escolha, ter opções. Além de ampliar a oferta, transmitir mensagens e valores. Mas essa idéia precisa ser desmembrada, há regiões que não reconhecem o teor cultural de sua sociedade, caso importante que vem ocorrendo a Jacarepaguá é o estímulo a produção do bairro através de projetos para esses artistas e comunidade. É extremamente necessário incitar por meio de atividades, debates e reuniões, parcerias, a familiarização da produção regional, assim pouco a pouco a comunidade vai reconhecendo o valor e o preço dos bens e serviços. Contudo não é se fechar e sim ampliar essa circulação e distribuição, trocas entre regiões, cidades, países devem ser estimuladas e refletidas.

Valor, Preço, Consumo:
É comum o setor cultural ver com maus olhos a palavra economia próxima da cultura, não podemos deixar de ter em mente que vivemos em uma sociedade capitalista e que injetar capitais na cultura se desdobra em mais cultura. Ou seja, gerar renda através da cultura deveria ser visto como algo compatível, apoiar a produção, o fazer cultural como profissão é reconhecer também o seu valor. Muitos bons profissionais e artistas estão se dedicando a outras profissões por não conseguirem se construir com a cultura. A falta muitas vezes de reflexão sobre o que estamos consumindo, favorece a produção do “mesmo” e pouco da novidade. Estar atento a isso, bem como, apreciar o que pode ser regional, atribuir valor e reconhecimento ao fomento cultural no espaço que constituímos nossa vida social, acompanha o desenvolvimento econômico, cultural e social local.

Quando o Jacarepaguá Cultural resolveu explorar este tema foi exatamente pensando no desenvolvimento cultural como um viés para contribuir no desenvolvimento social e econômico. Não há como a esfera cultural caminhar sem as outras esferas e modificar a sociedade, porém se bem trabalhada e respeitada pode auxiliar de maneira significativa na formação da sociedade, que hoje é tão carente principalmente de educação e cultura. Com cidadãos críticos e participativos, conseguimos mobilizar a compreensão do coletivo, do incentivo a arte e a tradição, fomento e democratização da cultura.

Ler também:
Fonseca, Ana Carla e MarcoKatiaEconomia da culturaidéias e vivências.

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